Este artigo tem como objetivo analisar como o cinema de Luis Buñuel lida com a devoção de protagonistas no exercício de algum grau no sacerdócio, especialmente o cristão, permeado pelo ateísmo do cineasta e pelo surrealismo em sua obra, já que os infortúnios da religiosidade são recorrentes como tema em sua filmografia. A partir dos conceitos de surrealismo e suas estratégias na construção audiovisual da desarticulação racional, três filmes com protagonistas sacerdotais são analisados em termos de quanto eles se alinham ou diferem daqueles atributos do movimento surrealista, em busca de particularidades. Os filmes são Nazarin (de 1959), Viridiana (de 1961) e Simão do deserto (de 1965). Eles também são comparados entre si e com as características surrealistas específicas e críticas da religião, recorrentes no trabalho do cineasta espanhol, a fim de observar em que medida elas se aplicam a cada um deles. Em todos os três filmes, as adversidades dos protagonistas reforçam a sensação de que sua devoção e seu sacrifício não podem tornar os beneficiários melhores nem realizar seus próprios planos. Na prática, a perspectiva supostamente isenta defendida pelo diretor reitera a inutilidade da fé, numa construção lógica que se afasta do princípio subconsciente surrealista, estratégia que somente Simão do deserto (de 1965) recupera claramente, embora mantendo a mesma tese.
This article aims to analyze how the cinema of Luis Buñuel deals with the devotion of leading characters in the exercise of some degree in priesthood, especially the Christian, permeated by the filmmaker’s atheism and the surrealism in his work, since the misfortunes of religiosity are recurrent as a theme in his filmography. From the concepts of surrealism and its strategies in audiovisual construction of rational disarticulation, three films with sacerdotal protagonists are analyzed in terms of how much they align or differ from those attributes of the surrealist movement, in search of particularities. The films are Nazarin (1959), Viridiana (1961) and Simão do Deserto (1965). They are also compared to each other and to the specific surrealistic characteristics and criticism of religion, recurring in the work of the Spanish filmmaker, in order to note to what extent they apply to each of them. In all the three films, the adversities of the protagonists reinforce the sense that their devotion and their sacrifice can’t make the beneficiaries better nor accomplish their own plans. In practice, the supposedly exempt perspective defended by the director reiterates the uselessness of faith, in a logical construction that moves away from the surrealist subconscious principle, a strategy that only Simão do Deserto (1965) clearly recovers, while still maintaining the same thesis.