INTRODUÇÃO: A Fibrose Cística (FC) é uma doença com grande heterogeneidade, tanto no padrão de acometimento dos órgãos/sistemas quanto na gravidade das manifestações clínicas. Entre os fatores que contribuem para a diversidade de apresentação fenotípica, destaca-se o genótipo. Adicionalmente, com os avanços na medicina de precisão, o conhecimento das variantes patogênicas do gene CFTR tornou-se fundamental na identificação da elegibilidade para utilização dos novos fármacos.
OBJETIVO: Descrever os principais fenótipos em uma população miscigenada com FC, correlacionando-os com seus genótipos e identificar os indivíduos elegíveis para uso dos moduladores da CFTR.
METODOLOGIA: Trata-se de um estudo de corte transversal, realizado em um centro de referência no Nordeste do Brasil. Foram incluídos todos os indivíduos com diagnóstico confirmado de FC e genótipo conhecido. Os dados clínicos e laboratoriais foram obtidos a partir de informações dos prontuários médicos. Os principais fenótipos registrados foram: insuficiência pancreática (IP), doença pulmonar (DP), colonização crônica por Pseudomonas aeruginosa (CC), doença hepática (DH) e diabetes. Os participantes foram classificados, segundo os seus genótipos, em três grupos: (1) homozigotos para a variante F508del; (2) heterozigotos para a variante F508del com a outra variante de classes I a III e (3) indivíduos com outras variantes.
RESULTADOS: Foram incluídos 66 indivíduos, 33 (50%) eram do sexo masculino, mediana da idade de 132,9 meses, 64 (96,9%) não brancos, 35 (53%) submetidos à triagem neonatal, 44 (66,6%) apresentavam ao menos uma variante F508del, sendo que destes, 9 pertenciam ao grupo 3. Cinquenta e três (80,3%) indivíduos apresentavam IP, 30 (45,5%) apresentavam DP, 13 (19,7%) eram cronicamente colonizados por P. aeruginosa, 13 (19,7%) tinham DH e 3 (4,5%) foram diagnosticados com diabetes. A IP ocorreu em 100% dos indivíduos classificados nos grupos 1 e 2. A frequência de DP foi de 57,9%, 43,8% e 36,4% entre os indivíduos dos grupos 1, 2 e 3, respectivamente. Dos indivíduos com CC, 10 (76,9%) foram classificados nos grupos 1 e 2 e dois (15,3%) indivíduos eram portadores de variantes de classe I em homozigose. Daqueles com DH, 9 (69,2%) eram homozigotos para F508del ou heterozigotos para essa variante com uma outra de classes I a III, dois (15,3%) eram homozigotos para variantes de classe I e um participante apresentava, ao menos, uma variante de função residual. Três indivíduos, todos do sexo feminino, apresentavam diabetes, sendo dois do grupo 1 (10,5%) e o outro do grupo 2. Quarenta e quatro indivíduos são elegíveis, em algum momento, a pelo menos um dos seguintes moduladores Orkambi®, Symdeko® e Trikafta®, segundo bulas aprovadas pela ANVISA.
CONCLUSÃO: Cerca de 70% dos indivíduos eram portadores de pelo menos uma variante F508del e elegíveis ao uso do Trikafta®, em algum momento. Indivíduos com duas variantes de classes I a III apresentaram fenótipos mais graves. A DP apresentou frequência semelhante entre todos os grupos apresentados.