O presente trabalho aborda a questão do aborto no Brasil a partir de uma perspectiva comparada com a Espanha, observadas as diferenças sociais e institucionais, jurídicas e políticas, permitindo-se uma observação comparativa por contraste. A partir de uma abordagem qualitativa, foi realizada uma pesquisa exploratória de natureza documental na legislação, doutrina e jurisprudência de cada país. No caso espanhol, observou-se dois principais momentos normativos: a descriminalização de alguns casos em 1985 e a regulamentação mais abrangente em 2010 que legalizou o aborto voluntário até a 14ª semana. O Brasil, por sua vez, proíbe a prática do aborto consentido, excetuando-se apenas três casos: existência de risco de vida para a gestante, gravidez advinda de estupro ou fetos com anencefalia (introduzido pela ADPF 54). Com isso, foi possível observar a articulação entre diferentes tipos de discursos (jurídicos, médicos etc.) em processos sistemáticos de justificação de violações a garantias constitucionais aos/às: direitos sexuais e reprodutivos femininos, autonomia da mulher, integridade física e psíquica da gestante, igualdade de gênero. Diante disto, no que pertine ao caso Brasileiro, reforça-se a centralidade do Supremo Tribunal Federal no debate ainda em curso no país sobre a constitucionalização do direito ao aborto e possíveis desdobramentos em diferentes esferas sociais. Assim, apesar das diferenças sociais e políticas dos países analisados, concluiu-se que o aborto, enquanto fenômeno social, gera impactos ainda não calculados, potencialmente severos, na saúde pública e na esfera individual das mulheres impactadas pela não legalização prática no Brasil. O complexo cenário sociocultural presente na realidade brasileira, somado ao difícil acesso a dados sobre a prática, impede que o debate seja realizado com laços fidedignos à real situação do país, dificultando a formulação de políticas públicas eficazes.
The paper explores the issue of abortion in Brazil from a comparative perspective with Spain, considering the social, institutional, legal, and political differences. The study employs a qualitative approach and involves exploratory documentary research into the legislation, doctrine, and jurisprudence of both countries. Spain had two key regulatory moments: the decriminalization of certain cases in 1985 and broader regulation in 2010 that legalized voluntary abortion up to the 14th week. In Brazil, however, abortion is generally illegal, except in cases where the mother’s life is at risk, in pregnancies resulting from rape, or in cases of fetal anencephaly (as established by ADPF 54). The analysis reveals how various discourses (legal, medical, and others) systematically justify violations of constitutional guarantees related to women’s sexual and reproductive rights, autonomy, physical and mental integrity, and gender equality. The paper underscores the central role of the Supreme Court in Brazil’s ongoing debate on the constitutionalization of abortion rights and the potential ripple effects in various social spheres. Despite the social and political differences between Brazil and Spain, the paper concludes that abortion as a social phenomenon can have significant, yet immeasurable, impacts on public health and individual women’s lives due to the practical illegality of abortion in Brazil. Brazil’s complex sociocultural context, along with the limited access to reliable data on abortion practices, hampers meaningful debate and complicates the formulation of effective public policies. Thus, the discussion around reproductive rights in Brazil remains challenging and highlights the need for a more open and informed approach.