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DATJournal

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ISSN: 2526-1789
Editor Chefe: Gilbertto Prado
Início Publicação: 11/10/2016
Periodicidade: Semestral
Área de Estudo: Arquitetura e urbanismo

Editorial

Ano: 2018 | Volume: 3 | Número: 1
Autores: R. Leote, A. Carvalho
Autor Correspondente: R. Leote | [email protected]

Palavras-chave: editorial, arte, design, tecnologia

Resumos Cadastrados

Resumo Português:

Nesta edição do DATJournal – Design Art and Technology, transitamos entre os processos, atributos e intensidades da relação corpo/objeto/espaço, tanto nas contribuições teóricas como nas proposições artísticas que participam da galeria de imagens que incluímos. Evidencia-se a condição híbrida das linguagens que alargam as fronteiras do organismo corpóreo com a tecnologia, o design, a performance, o cinema, a moda e a arte. Partimos do pressuposto de que o corpo é um organismo complexo, do qual cérebro e mente são partícipes por diferentes e inapreensíveis mecanismos de simbiose e de que ele está estruturalmente acoplado ao seu ambiente – povoado de espaços distintos – numa conjuntura de construção mútua e contínua. O corpo, dotado de diferentes formas de colaboração e transdução entre organismos similares ou díspares, transforma, adapta e abduz, mas também expurga antigas estratégias de acoplamento, fazendo infinito o processo evolutivo. Todos os mecanismos de tais processos relacionais acontecem pelos aspectos sensíveis, inconscientes, subjetivos e conscientes das mentes que interagem. Aspectos que são, indubitavelmente, individuais. A individualidade reduz nossa capacidade de encontrar uma definição ou distinção objetiva e mensurável da natureza do corpo. A presente edição trata do corpo, onde reside a condição humana, e do ambiente contaminado por diferentes tecnologias sem que nelas esteja nosso foco. Mas, destacamos certos processos maquínicos que potencializam a percepção do corpo, modificando a articulação com o mundo exterior. Exploramos a pluralidade de interfaces naturais e tecnológicas, que impactam na materialização de uma infinidade de dados e imagens, que interferem nos nossos sentidos. Na época em que vivemos, a capacidade de acesso aos processos orgânicos é, cada vez mais, visualizável. Enquanto a neurociência se esforça para dar resultados apreensíveis dos estados cerebrais dentro do organismo que aparenta conhecer, mais dúvidas surgem sobre a verdadeira natureza da mente. A mente, essa entidade, inapreensível pelas tecnologias disponíveis, continua um mistério que apenas tangenciamos quando abordamos a percepção, a poética das obras, a interação do indivíduo com proposições artísticas e a própria produção do artista. Interator que é corpo, artista que é corpo. O escopo desta edição trouxe a abertura necessária para se falar dos aspectos não circunscritos, nem alocados por classificações estanques de propostas e enfoques artístico científicos. Quisemos encontrar um elo entre aportes diversos sobre as abordagens ligadas ao tema corpo/objeto/espaço. Assim, buscamos artistas pesquisadores, brasileiros e estrangeiros, que complexificam tal tema, justamente pela diversidade, tanto nas produções teóricas, quanto nas poéticas. Organizamos esta edição em três seções. A primeira, intitulada “Percepções”, traz um conjunto teórico onde a percepção, o cérebro, a mente e a cognição são fios de aproximação e desconexão entre os autores. A segunda, cujo título é “Transduções”, apresenta o discurso sobre produções artísticas, onde o corpo se aloca em espaços de fisicalidade e conceituação diversas, abrangendo a performance, o cinema, o vídeo, a fotografia, a poesia, o design e a arquitetura. A terceira seção traz uma curadoria de imagens, nomeada “Corpus Poeticus: uma visita à poética das imagens”, que traz traduções intersemióticas, impressões de olhares, pesquisas e experimentos de artistas que estão inseridos nas transduções corpo/espaço que se manifestam na poesia, na fotografia, na performance, no design e na pintura digital. Esmiuçando a distribuição de assuntos, o leitor encontrará na seção “Percepções” uma parte da pesquisa sobre neurocinema, desenvolvida pela finlandesa Pia Tikka, aplicada sobre um estudo de caso, em conjunto com outro finlandês, Mauri Kaipainen. Trata-se da análise de um dos filmes de Maya Deren (At land) com a qual eles defendem a tese de que tal filme seja um exemplo precursor do que eles entendem como “cinema enativo”. Além desta análise, vai interessar ao leitor detalhes da carreira de Maya Deren, que ali constam, e que são pouco encontrados na bibliografia em língua portuguesa. Em seguida, discutindo os conceitos de affordance e enação, conectando-se, diretamente, com o texto anterior, Cleomar Rocha e Pablo de Regino traçam uma clara abordagem sobre estes temas, com enfoque nas instalações interativas e suporte na fenomenologia. A fim de ilustrar a natureza desses conceitos, eles utilizam a instalação interativa “Espante os corvos de Van Gogh”, produzida pela equipe do Media Lab / UFG em 2011, laboratório do qual Cleomar Rocha é diretor. Trazendo considerações polêmicas a respeito da mente e da consciência, Fernando Fogliano discute a possibilidade da existência de um tipo de inconsciente maquínico, fruto da extrassomatização de nossos cérebros no ambiente, que poderia gerar máquinas eficientes para promover o que ele chama de “um jogo de mentiras sinceras na arte”. O argumento gira em torno de Mimo Stein, um robô de conversação criado por Fábio Fom. A portuguesa, Maria Manuela Lopes, parte das tatuagens ligadas a rituais simbólicos para prometer um cenário de ficção científica na arte, quando fala de avançadas tecnologias biocompatíveis e “tatuáveis”, com finalidades médicas, mas cujo potencial o artista consegue perceber e, a partir dessa percepção, é capaz de propor arte. Demonstrando isso, a autora apresenta seu projeto Emerging Self, que trabalha o conceito de tatuagem dinâmica. Em seguida, apresentamos a linguagem do vídeo e do cinema, iniciando com Fernanda Duarte, que avança no estudo das tecnologias de performances de palco, desenvolvendo a crítica, tanto sobre as dificuldades no uso dos dispositivos computacionais e eletrônicos neste contexto, como demonstrando possibilidades e opções científicas e tecnológicas, num esforço de enfatizar as potencialidades poéticas que estas tecnologias têm para compor uma linguagem única da obra composta pelo performer, público e elementos de cena. Júlio Mendonça apresenta um texto fundamentado nos conceitos de intersemiose e holossignia. Traz a discussão da hibridização das linguagens da poesia e do cinema experimental e apresenta as alterações da narrativa fílmica a partir do diálogo com a tecnologia apontando como a variedade de soluções reverbera em signos e estabelece um resultado multimidiático, que interfere na percepção do interator. Então, trazemos Carolina Peres que, visando um estudo sobre a relação do corpo com a câmera e o espaço sensível entre eles, nos traz a fotografia do ponto de vista de uma pessoa que reconhece o seu corpo como integrante da obra fotográfica, para além do visual. Ela entende a fotografia como um processo relacional, uma experiência direta, com o objeto tecnológico, até a conformação da imagem nos seus atributos finais. O corpo, transformado pelas cirurgias plásticas, tem uma transfiguração subjetivada nas mãos de Raquel Fonseca. Seu discurso e recorte do olhar fotográfico sobre o tema, conduz o percebedor a um caminho que não termina na estética corpórea – resultado da cirurgia –, mas no maravilhamento do artista que aqui nos referimos no sentido peirceano, sobre o tempo retido nas mãos do cirurgião. Colocando aí uma zona estreita entre o propósito da pessoa que se submete a este tipo de reconstrução corpórea e o daquela que prefere o estado de estranhamento no processo modificador. A segunda seção, “Transduções”, faz uma ponte entre arte, arquitetura, design e engenharia computacional. Iniciamos com Tania Fraga, que desenvolve uma reflexão sobre seus últimos 30 anos de carreira, onde mostra uma visão antecipadora de aplicações alargadas do que são, para ela, as tecnologias computacionais, com as quais a pessoa pode vivenciar, de corpo inteiro, experiências de simulação que são integrais, inclusive mediadas por biocomputação. Na sequência, Hugo Fortes observa os objetos que o cercam e, nesta reflexão, apresenta o entrelaçamento da arte e do cotidiano. Discorre sobre trabalhos individuais e de projetos que são resultados da parceria com Sissi Fonseca, sua companheira, tanto na produção artística, como na vida. Apresenta o sentido e os processos de suas criações performáticas, revelando fragmentos das histórias íntimas dos artistas e o enfrentamento do mundo ao redor. Suzete Venturelli, em colaboração com vários estudantes e pesquisadores do Media Lab / UNB incluindo Cleomar Rocha, e do Media Lab / UNIFESSPA, com a participação de Teófilo Augusto e Cláudio Coutinho, discorrem sobre recentes produções dos laboratórios, realizadas em parceria, onde a poiesis do corpo se apresenta em sintonia e diálogo com a praxis tecnologizada, promovendo obras autopoiéticas. É interessante observar a diversidade de proposições que esta cooperação traz, utilizando-se de tecnologia aberta e de baixo custo. Às vezes os experimentos ainda não têm uma definição final, mas o potencial da produção artística está ali impresso. Temas como o erotismo, os objetos vestíveis interativos e as apropriações poéticas da paisagem são exemplos da diversidade animadora de abordagens. O encontro entre Agda Carvalho, Edilson Ferri, Clayton Policarpo, Daniel Malva, Miguel Alonso e Sergio Venâncio resulta em um processo colaborativo e multidisciplinar com o projeto “Ex-votos”. O texto traz a proposição Sala dos Milagres que aborda um corpo expandido e articulado com o ritual presente na cultura popular dos ex-votos. Um corpo que está além da sua condição fisiológica, mas que altera o mundo e, ao mesmo tempo, é influenciado pelo por ele. O texto elabora uma reflexão sobre contínua proliferação de imagens cotidianas, que são compartilhadas na rede, trazendo, assim, a virtualização do processo de reconhecimento da imagem como representante do mundo natural. Ao encontrar a terceira seção, “Corpus Poeticus…”, preferimos que o leitor/experienciador descubra, por si só, nossa intenção com esta curadoria. Esperamos também que o leitor/experienciador desta edição compartilhe conosco a impressão de que, dos vários recortes possíveis de aproximações e transduções entre corpo, objeto e espaço, o que propusemos aqui mostra o engendramento, inequívoco e permanente, do ser humano (e em nosso caso, do artista) com as formas contínuas e, também, impermanentes, de acoplamento entre o ser, o fazer e os objetos do mundo, isto é, a extrassomatização de todo o conhecimento adquirido longínqua ou recentemente. Gostaríamos de agradecer aos pesquisadores autores dos artigos e aos artistas que premiaram nossa edição, participando com suas obras visuais, desde que todos eles investigam e contribuem para desvendar a questão paradoxal do corpo/objeto/espaço em nossa área. Da mesma forma, somos gratas a todos que, de formas diversas, colaboraram para que esta publicação se concretizasse. Nosso agradecimento se estende ao Programa de Pós-Graduação em Design da Universidade Anhembi Morumbi, cujo empenho na qualificação do DATJournal nos deu abertura para o desenvolvimento deste trabalho. Rosangella Leote Agda Carvalho São Paulo, Maio de 2018