Este artigo apresenta uma leitura do romance O Vale da Paixão, de LÃdia Jorge, a partir da perspectiva das memórias pós-ditadura. Por este viés, examina-se a relação entre a famÃlia que protagoniza a trama, os Dias, e o salazarismo, regime de exceção vivido em Portugal. Para tanto, são destacados elementos que traem as simetrias entre os sistemas analisados (familiar e estatal-ditatorial) e mostram como o salazarismo é constituinte da narrativa. Assim, verifica-se em que medida a famÃlia portuguesa retratada no romance serve como meio simbólico de representação da situação social de Portugal durante a ditadura, vez que no grupo familiar podem ser percebidos todos os aspectos do regime, tal como: a obediência das massas, a subversão das minorias, a dominação, a restrição das liberdades fundamentais. As memórias da ditadura são reveladas como elemento integrante das memórias da famÃlia: há duas memórias mobilizadas de forma intrincada e rememoradas indistintamente. Pretende-se demonstrar, com isso, que a famÃlia Dias obedece a uma estrutura especÃfica e tradicional que apresenta Ãntima relação com estrutura polÃtica do Estado português no perÃodo em que se passa a diegese. A análise exposta encontra aporte teórico em obras de Tzetan Todorov, de Beatriz Sarlo e de Michel Pollak.