Eleito em 2018, Jair Bolsonaro promove uma crescente ideologização das até então pragmáticas políticas de Estado. A criação de uma nova cultura política se inicia; programada para questionar o funcionamento e a organização do Estado brasileiro, ela instiga a superação de dogmas promovidos por governos anteriores, como a preferência pelo multilateralismo e a priorização de relações Sul-Sul. Nesse sentido, o presente artigo procura apontar, por meio da análise dos discursos presidenciais oficiais realizados entre janeiro de 2019 e junho de 2021, evidências do processo de ideologização da política externa brasileira promovido por Bolsonaro. A partir de uma percepção construtivista do sistema internacional e dos agentes nele inseridos objetiva-se, em última instância, o estabelecimento de um nexo causal entre a promoção de preferências ideológicas enquanto políticas de governo e o crescente desuso de mecanismos multilaterais regionais. Observa-se, destarte, que a instrumentalização do discurso enquanto um dos meios centrais do fazer política é refletida diretamente nos desenvolvimentos da política internacional brasileira, impactando as relações de cooperação do Estado com seus pares.