O presente trabalho tem como objetivo pôr em discussão a linguagem da
obra Finnegans Wake (1939) do autor irlandês James Joyce, pensando-a através
do conceito da “palavra faltante†(“lacking wordâ€), expresso por George Steiner em
Depois de Babel, como definidor da produção poética ocidental a partir da década
de 1870, evidente a princÃpio sobretudo nos poemas de Rimbaud e Mallarmé, em
que a dificuldade que o texto apresenta ao leitor é de uma ordem diferente da
suscitada por toda a literatura produzida anteriormente. A essa noção articulamos
a de “obra aberta†de Umberto Eco e os contrastes entre linguagem poética e
linguagem ideológica, conforme definidos por George Steiner, Terry Eagleton e
Stewart Curran, presentes em germe desde o segundo momento do romantismo
inglês em Percy Bysshe Shelley (Prometeu Desacorrentado, 1820) e seu
“apocalipse humanistaâ€. Joyce, como romancista, com frequência é visto em
oposição a Mallarmé, poeta, proferidor da máxima do dever de se “purificar as
palavras da triboâ€, tornadas desgastadas e esvaziadas de seu sentido pelo uso do
cotidiano. No entanto, comparado aos outros romancistas do perÃodo, como
William Faulkner (O Som e a Fúria, 1929, Enquanto Agonizo, 1930), e mesmo
com sua própria produção anterior (O Retrato do Artista Quando Jovem, 1916,
Ulisses, 1922), em muitos aspectos, Joyce, no trabalho com a linguagem do
Wake, vai além da prosa romanesca e da adaptação da técnica literária Ã
representação mimética. Assim, ele se aproxima da linguagem poética, valendose
de técnicas chamadas já de “palavras-valiseâ€, “trocadilhos†ou “ideogramas†e
de chaves de leitura fornecidas pelo próprio texto para gerar significados a partir
dessas palavras, numa liberdade de atribuição de sentidos por parte do leitor
fundamentada na comunicação incompleta e limitada quase que unicamente pela
rÃgida estrutura do texto.
The present paper has the objective of putting into discussion the language
of the work Finnegans Wake (1939) by the Irish author James Joyce, pondering it
through the concept of the “lacking wordâ€, as expressed by George Steiner in After
Babel, as the defining feature of Western poetic production after the decade of
1870, evident at first especially in the poems of Rimbaud and Mallarmé, where the
difficulty offered by the text to the reader is of an order different than that of the
entire literature previously produced. To this notion we articulated that of Eco's
“open work†and the contrasts between poetical and ideological language, as
defined by George Steiner, Terry Eagleton and Stewart Curran, present in germ
ever since English Romanticism's second moment in Percy Bysshe Shelley
(Prometheus Unbound, 1820) and his “humanist apocalypseâ€. Joyce, as a novelist,
is often seen in opposition to Mallarmé, a poet, pronouncer of the aphorism of
“purifying the words of the tribe†as the duty of the poet, worn down and emptied of
their meaning by daily use. However, when compared to other novelists of the
same period, like William Faulkner (The Sound and the Fury, 1929, As I Lay
Dying, 1930), and even with his own previous production (A Portrait of the Artist as
a Young Man, 1916, Ulysses, 1922), in many aspects, Joyce, in his work with
Wake's language, goes beyond that of the novel's prose and the adaptation of
literary technique to mimetic representation. Thus, he comes closer to poetic
language, using techniques already referred to as “mots-valisesâ€, “puns†or
“ideograms†and reading keys supplied by the text itself to generate meanings
from such words, in a type of freedom regarding meaning attribution by the reader
based on incomplete communication, limited almost only by the rigid structure of the text.