Gilberto Mendes (1922-2016), compositor brasileiro da segunda metade do século XX, criou a obra O meu amigo Koellreutter, para voz feminina, marimba e piano, no ano de 1984, em comemoração ao septuagésimo aniversário de Hans-Joachim Koellreutter. Trata-se de uma canção sem palavras, em que a ausência de texto faz aflorar as múltiplas interpretações, não delimitadas por um código verbal específico. Vislumbra-se, dessa forma, a universalidade dos sentidos primordiais da voz. Nela se evidenciam as nuances sutis do pentatonismo numa estrutura minimalista, trazendo à tona a influência de certa musicalidade japonesa. O compositor da canção, na busca por uma poética pessoal, a ser construída a partir de influências cosmopolitas, encontra-se com outro agitador cultural, ávido também na procura de questões instigantes em relação à modernidade: Koellreutter. Nasceu na Alemanha, em 1915, atuando inicialmente como flautista. A vinda ao Brasil, em 1937, deveu-se ao nazismo que assolava o país. Professor de vários compositores e educadores de música no Brasil, fez parte do Música Viva, intenso movimento de revitalização artística, pedagógica e cultural. O contato com o Japão, na década de 50, permitiu-lhe vivenciar um modelo de sincretismo entre o tradicional e o novo, o ocidente e o oriente. Gilberto Mendes encontra, nessa fusão cultural de Koellreutter, um motivo para a sua composição musical, recriando de forma lúdica, a partir de uma perspectiva brasileira, um modo de traduzir o Japão. Da imanência à manifestação, a atmosfera japonesa ganha corpo na produção da canção brasileira.
Gilberto Mendes (1922-2016), a Brazilian composer of the second half of the twentieth century, created the work O meu amigo Koellreutter for female voice, marimba, and piano in 1984 to commemorate the seventieth birthday of Hans-Joachim Koellreutter. O meu amigo Koellreutter is a song without words in which the absence of text brings out multiple interpretations not limited to a specific verbal code. One glimpses thus the universality of the primary senses of the voice. The subtle nuances of pentatonicism combined with a minimalist structure reveal the influence of a certain Japanese musical style. With O meu amigo Koellreutter, Mendes, in search of his own compositional poetics built from cosmopolitan influences, encounters another cultural activist also eager to introduce thought-provoking ideas regarding modernity: Koellreutter. Koellreutter was born in Germany in 1915 and worked as a professional flutist during his early years, moving to Brazil in 1937 due to the Nazi rule in Germany. In Brazil as a professor of various composers and music educators, Koellreutter formed an integral part of the Música Viva, a musical movement of intense artistic, educational, and cultural revitalization. Contact with Japan in the 1950s allowed him to experience a model of syncretism between both the traditional and the new and East and West. In Koellreutter’s cultural fusion, Gilberto Mendes finds a purpose for his own style of musical composition, suggesting in a playful manner, from a Brazilian perspective, a new way of decoding Japan. The influence and history behind Mendes’ O meu amigo Koellreutter demonstrates how, from imminence to manifestation, a Japanese atmosphere is embodied in the production of the Brazilian art song genre.