O presente texto esboça um retrato de uma
cigana possÃvel. A partir de suas narrativas a respeito de sua
história de vida e, em particular, da vivência de uma perda,
busca-se traçar uma aproximação com um sujeito especÃfico
sem deixar de buscar situar esse sujeito como parte do
universo sociocultural em que se encontra imerso. Com
isso, procura-se também exprimir certos enclaves desse
universo e algumas de suas tensões chaves a partir do
esforço em conformar uma “biografia pessoalâ€. Para tal, este
retrato é composto a partir de um rearranjo e
contextualização das palavras e sentenças que a personagem
se utiliza para exprimir suas lembranças, projetando uma
reflexão sobre si mesma, ao mesmo tempo em que atualiza
sua auto-imagem. Esta auto-imagem, por sua vez,
permanece indissociável das lembranças e sentimentos que a vinculam a seu pai, já morto - haja vista que a morte de
seu pai, seus sentimentos e esforço em lidar com essa perda,
sejam centrais em seu trabalho de autoconstrução. Em todo
caso, é apenas por referência adequada a ele que se torna
possÃvel para ela definir-se enquanto pessoa, e pessoa
cigana. Isso não ocorre sem fricções e ambiguidades
emergidas em meio a suas relações com pessoas e
instituições pertencentes a mundos que, enredados uns nos
outros, por vezes se contrapõem, no anseio de preservarem
suas próprias fronteiras.