A despeito dos discursos de “igualdade de direitos” e de “impessoalidade das leis” que intercalam a narrativa democrática brasileira, tradicionalmente, o exercício efetivo de uma cidadania urbana esteve vinculado a estritas noções de civilidade operadas em benefício de poucos e em detrimento de muitos. As periferias constituem um reflexo ambíguo desse processo. Ao mesmo tempo em que se apresentam como retratos das injustiças perpetradas contra os menos favorecidos, delas decorrem forças distintas (complementares ou excludentes) de contestação dessas injustiças, expressas na ressignificação do próprio sentido de exercício da cidadania, fazendo-a valer pelo uso da violência ou inscritas na apropriação e mobilização dos recursos políticos à disposição para subverter as lógicas de desigualdade em operação. Partindo do pressuposto de que os critérios de elucidação das categorias mobilizadas pelos distintos atores que integram a cena urbana brasileira informam a narrativa do ponto de vista daqueles que o ocupam o lugar de fala, neste artigo, articulamos conceitos da teoria sociológica dos conflitos em torno dos discursos dos “sujeitos periféricos” para refletirmos sobre as condições de exercício de uma cidadania citadina no Brasil.