No Brasil, por razões históricas, a história e a cultura de certos grupos
estigmatizados estabelecidos no território foram negadas. No século XX, o mito
da democracia racial e o elogio da miscigenação contribuÃram para apagar a
diversidade, as particularidades dos grupos étnicos, as desigualdades gritantes
em seu acesso aos direitos fundamentais. Eles continuam a impor um racismo
geralmente admitido com respeito aos descendentes africanos e das outras
minorias étnicas, racismo que se ilustra também pela negação de sua
contribuição à história nacional. Entretanto, no contexto de democratização da
sociedade brasileira e sob a pressão de “novos atores sociaisâ€, favorecidos por
um contexto internacional propÃcio, o reconhecimento da diversidade cultural e
a luta contra as discriminações entraram na agenda polÃtica brasileira. Ela
tomou, igualmente, a forma de polÃticas educacionais de reconhecimento e de
valorização dos povos nos conteúdos de ensino. Trata-se, com essas medidas
curriculares, de reabilitar a identidade e a história das minorias vÃtimas de
discriminação até então ou de fazer com que uma verdadeira história comum
surja dessa anamnese? No primeiro caso, o multiculturalismo conduz Ã
justaposição de memórias particulares em que coabitam grupos dominantes e
dominados de ontem. No segundo caso, trata-se de assegurar as condições de
possibilidades para que as histórias particulares tornem-se assunto de todos. É
por tentar trazer elementos suscetÃveis de alimentar a reflexão acerca desta
questão que nos propomos a analisar o conteúdo das instruções legais que
organizam o currÃculo formal brasileiro, a partir de 1988, com relação à questão
da diversidade e da diferença.
Curriculum policy in Brazil: between valuing cultural diversity,
consideration of particular memories and building a shared history
In Brazil, for historical reasons, the history and culture of certain stigmatized
groups established in the territory were denied. In the twentieth century, the
myth of racial democracy and miscegenation praise helped to erase the
diversity of the particular ethnic groups, their gross inequalities in access to
fundamental rights. They continue to impose a commonly accepted racism
against African descendants and other ethnic minorities, which is illustrated also
by the denial of their contribution to national history. However, in a context of
democratization of Brazilian society and under the pressure from the so-called
"new social actors", supported by a conducive international environment, the
question of recognition of cultural diversity and the fight against discrimination
entered the Brazilian political agenda. It is illustrated in a particular curricular
policy to recognize and value the history and culture of indigenous and black
populations. Do these curricular changes help to rehabilitate the identity and
history of minorities discriminated until then, or to make a common story
emerge from this anamnesis? In the first case, multiculturalism leads to the
juxtaposition of particular memories where dominant and dominated groups
from yesterday coexist. In the second case, it is to ensure conditions of
possibilities of a process that makes these particular stories become everyone's
business. The analysis of official instructions that organize the formal curriculum
of compulsory education in Brazil will enable us to provide elements that could
foster this reflection.