Após décadas de lutas pela reforma do sistema de internação psiquiátrica no Brasil, em 2001 foi publicada a Lei no 10.216. Inspirada nos postulados da antipsiquiatria e da criminologia crÃtica, estabelece direitos e garantias aos portadores de sofrimento psÃquico e proÃbe internações em instituições com caracterÃsticas asilares. Além disso, define formas de tratamento baseadas no respeito à dignidade e à autonomia do usuário do sistema de saúde mental. No entanto, apesar de a referida lei não excluir portadores de sofrimento psÃquico que praticaram delitos, após uma década de vigência os manicômios judiciais brasileiros seguem intactos, imunes aos preceitos da reforma. Assim, o estudo pretende relatar o quadro atual da punição dos portadores de sofrimento psÃquico no Brasil por meio da aplicação judicial de medidas de segurança em regime manicomial. A pesquisa se justifica não apenas em razão da exclusão dos atores de delitos da incidência da Lei da Reforma Psiquiátrica, mas, sobretudo, pela evidente violação aos direitos humanos dos portadores de sofrimento psÃquico submetidos à internação manicomial. A hipótese central do trabalho é a de que o rótulo criminoso cria espécie de justificativa metanormativa que legitima a imposição de regimes carcerários como forma de sanção, para além dos limites legalmente impostos.
In 2001, following decades of demands for reforms in the system of psychiatric admission in Brazil, Federal Law 10.216 was published. Inspired by the postulates of Antipsychiatry and of Critical Criminology, defines the rights and grants protection to mentally disordered individuals and forbade the admission of mentally ill patients in asylums. Furthermore defines treatment based on the principles of respect for the dignity and the autonomy of users of the mental health system. However, despite the fact that the aforementioned law does not exclude mentally disordered offenders, after a decade of its publication nothing has changed in the psychiatric institutions under judicial control, which remain immune to the provisions of the reform. Thus, the study aims to report the current practice of punishing the mentally ill in Brazil through psychiatric institution orders. The research is justified not only because the offenders exclusion from the incidence of the Mental Heath Act but, above all, the obvious violation of human rights of mentally disordered offenders who are sent to asylums. The central hypothesis is that the criminal label creates a metanormative justification that legitimates the imposition of incarceration as a form of punishment beyond legal restrictions.