O presente ensaio visa propor uma abordagem teórico-prática de algumas das linhas orientadoras da estética compositiva de Ana Cristina Cesar. Este trabalho, deter-se-á, fundamentalmente, nas implicações relativas a dois fenómenos: a intertextualidade (que a autora designa como “vampirismo” ou “ladroagem”) e o fingimento poético, partindo da análise dos poemas “Carta de Paris” (CESAR, 2013, p. 194-195), “Soneto” (CESAR, 2013, p. 151) e “Final de uma ode” (CESAR, 2013, p. 21). Ao longo das próximas páginas, sustentando a argumentação em estudos sobre as várias conceções do canibalismo e da sua essência (ANTELO, 2001; KLANG, 2011; FRIAS, 2017; ALMEIDA, 2005) bem como sobre a dissimulação lírica (PESSOA, 2006a), pretende-se discorrer sobre o modo como a autora tirou partido desses mecanismos para a elaboração dos seus poemas. Sublinhar-se-ão, ainda, algumas das potencialidades que daí advêm. Assim, procura-se demonstrar que a poética de Ana Cristina Cesar é “muito construída, muito penosa (...), tem tudo” (CESAR, 1999a, p. 271) e destacar quer uma conceção não pejorativa do fenómeno antropofágico quer o ímpeto fragmentário e evasivo do sujeito lírico patente no corpus de textos selecionados para a discussão e análise.
The current essay aims at starting a theoretical-practical reflection on some of the guidelines of the compositional aesthetics of Ana Cristina Cesar. This paper will focus mainly on the implications of two phenomena: intertextuality (which the author calls “vampirismo” or “ladroagem”) and poetic pretense, based upon an analysis of poems like “Carta de Paris” (CESAR, 2013, p. 194-195), “Soneto” (CESAR, 2013, p. 151) and “Final de uma ode” (CESAR, 2013, p. 21). In the course of these pages, supporting my arguments on studies of numerous conceptions of cannibalism and of its essence (ANTELO: 2001; KLANG, 2011; FRIAS, 2017; ALMEIDA, 2005) as well as on lyrical dissimulation (PESSOA, 2006a), it is intended to discuss the way the author made use of these mechanisms for her poems‟ composition. The potential that comes from them will also be explored. Hence, it‟s my goal to demonstrate how Ana Cristina Cesar‟s poetics is “muito construída, muito penosa (…), tem tudo” (CESAR, 1999a, p. 271) and to emphasize a non-pejorative concept of the anthropophagical phenomenon and the fragmented and evasive impetus of the lyrical subject presented in the corpus selected for the discussion and the analysis.