A autodenominada “sociedade ocidental cristã” tem o hábito de entender a si mesma como norma e, até mesmo, como o único modelo válido de sociedade, para a qual as demais tradições são estranhas. Consequentemente, o modelo de política é determinado por aquilo que essa sociedade entende como sendo sua própria tradição histórica e pelas reflexões, teorias e formas de governo que fazem parte dessa história. o grande problema enfrentado pelo olhar “ocidental” sobre questões políticas de povos cujas tradições se assentam sobre bases diferentes é a desconsideração de aspectos religiosos e culturais específicos dessas sociedades que, inevitavelmente, têm consequências diretas na estrutura política. Além disso, oculta parte de suas origens e nega seu parentesco, entendendo estas influências como irrelevantes, indignas de nota ou invasoras orientais. Mas, o fato é que tanto o Judaísmo quanto o Islã possuem uma teoria política própria com suas particularidades que parece ser muito pouco compreendida pelos estudiosos “ocidentais”. Este artigo pretende abordar esta questão a partir das indicações acerca da política apresentada por Maimônides no contexto de sua teoria da Profecia, partindo da ideia já proposta por Strauss de que “Há, na filosofia de Maimônides, assim como naquela de seus mestres muçulmanos e de seus discípulos judeus, uma ciência política”. Nossa hipótese fundamental é a de que há, na teoria da profecia, elementos que influenciam a concepção de estrutura social e, geram consequências importantes para a política, como, as diferenças hierárquicas entre os homens e as questões referentes à lei. A atualidade desta questão reside justamente nas discussões acerca do Estado Laico e no apelo religioso advogado por alguns políticos da atualidade que se dizem, inclusive, divinamente inspirados.
The self-proclaimed “western Christian society” is used to understand itself as the norm, and even as the only valid model of society, to which other traditions are foreign. Consequently, the political model is established by what such a society understands as its own historical tradition and by the doctrines, theories and forms of government that are part of this specific history. The major problem faced by the “Western” view on political issues of different people whose traditions are settled on different groundings is the disregard of specific religious and cultural aspects of these societies, that inevitably have direct consequences on their political structure. In addition, our western Christian society hides part of its origins and denies its kinship, understanding these influences as irrelevant, unworthy or coming from invasive Eastern sources. But the fact is that both Judaism and Islam have their own political theory, with peculiarities that seems to be very poorly understood by “western” scholars. This article intends to address this issue from the political indications presented by Maimonides in the context of his theory of Prophecy, starting from the idea already pointed by Strauss that “There is, in the philosophy of Maimonides, as well as in that of his Muslim masters and his Jewish disciples, a political science”. Our main hypothesis here is that in the Theory of Prophecy there are elements that influence the design of social structure and generate important consequences for politics, such as the hierarchical differences between men and some aspects concerning the law. The currentness of this question lies precisely in the discussions about the secular State and in the religious appeal advocated by some contemporary politicians who claim to be divinely inspired.