Nos últimos anos, uma atenção crescente às especificidades da detenção feminina estimulou a adoção de um corpus consolidado de ferramentas internacionais de soft law, bem como relatórios sobre as condições das mulheres encarceradas. Esse momento não se refletiu nas decisões dos tribunais para que o gênero fosse tratado como uma questão-chave na determinação de possíveis violações dos direitos das pessoas em situação de privação de liberdade, nem em nível doméstico nem internacional.
O artigo explorará a lacuna existente entre esta legislação e as políticas e sua implementação, com foco especial na jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos. A perspectiva adotada pela Corte na interpretação das especificidades de gênero das mulheres em situação de privação de liberdade parece estar acriticamente fundada no paradigma da vulnerabilidade e na proteção da maternidade. Tentaremos decodificar essa ideologia normativa e lê-la em contexto e em comparação com a jurisprudência consolidada da Corte sobre a noção legal de vulnerabilidade na prisão, bem como com sua jurisprudência sobre tópicos de gênero e sobre a proibição de discriminação. A análise destacará os aspectos mais críticos da interpretação tradicional da igualdade de gênero na prisão, bem como a necessidade de reconsiderar o gênero como uma questão relevante na proteção dos direitos das pessoas em situação de privação de liberdade.
In recent years, a growing attention for the specificities of female detention has spurred the adoption of a consolidated corpus of international soft-law tools, as well as reports on the conditions of incarcerated women. This momentum has not been paralleled by court decisions focusing on gender as a key issue in determining potential violations to prisoners’ rights, neither at a domestic nor at an international level.
The paper will explore the gap between said legislation and policies and their implementation, particularly focusing on the case law of the European Court of Human Rights. The perspective adopted by this Court in interpreting the gender specificities of women in prison seems to be uncritically grounded in the vulnerability paradigm and the protection of motherhood. We will attempt to decode this normative ideology and to read it in context, and in comparison with the consolidated case law of the Court on the legal notion of vulnerability in prison, as well as with its case law on gender topics and the prohibition of discrimination. The analysis will highlight the most critical aspects of the traditional interpretation of gender equality in prison, as well the need to reconsider gender as a relevant issue in the protection of prisoners’ rights.