Pode-se considerar como cientÃfico o discurso freudiano? Esta é uma questão que tem sido discutida desde os primórdios da psicanálise e recebido por parte de vários estudiosos, notadamente de lógicos, a resposta negativa. Em consonância com tais crÃticas, alguns teóricos se empenharam para oferecer à psicanálise uma roupagem compatÃvel com as exigências dos lógicos. Os ensaios de releitura do discurso freudiano vêm tanto do interior da psicanálise como do exterior. No primeiro caso, situa-se a tentativa de D. Rapaport de reintegrar a psicanálise na psicologia cientÃfica. No segundo, o empenho de B. F. Skinner para se apropriar da teoria psicanalÃtica, tendo em vista submetê-la ao esquema behaviorista estÃmulo-resposta. Ricoeur contesta energicamente esta postura reducionista. As reformulações operacionalistas e behavioristas, como denuncia o pensador francês, sequer acenam com a possibilidade de se colocar a questão do sentido. Ora, alijar o sentido do discurso metapsicológico é desfigurar a psicanálise, a ponto de torná-la irreconhecÃvel. Contudo, não é menos grave a falta inversa: reter apenas a interpretação, sem levar em conta as forças que distorcem o sentido. No entanto, este equÃvoco foi cometido por vários teóricos, notadamente, R. Dalbiez e J. Hyppolite. O primeiro distingue e separa a doutrina freudiana, considerada por ele como fisicista e naturalista, do método psicanalÃtico, o qual, no seu entender, seria bem fundamentado e corresponderia à psicanálise propriamente dita. Fazendo eco a Dalbiez, Hypppolite denuncia o contraste entre o suposto positivismo teórico de Freud e o seu método clÃnico interpretativo. O ponto mais crÃtico do discurso freudiano seria a concepção energética do psiquismo. Ricoeur retoma a discussão do “problema epistemológico do freudismo†no ponto em que Hyppolite a deixou. Este problema, para ele, toma a forma de uma aporia cujos termos são a energética e a hermenêutica. Como justificar uma econômica que se funda na interpretação clÃnica dos sonhos, sintomas e atos falhos e uma interpretação que deve necessariamente recorrer à explicação econômica, com seus modelos energéticos, profundamente estranhos ao sentido? Segundo Ricoeur, o discurso psicanalÃtico é simultaneamente energético e hermenêutico, explicativo e interpretativo. “A psicanálise não é uma ciência de observaçãoâ€, sintetiza nosso pensador, mas uma ciência hermenêutica.