Este trabalho parte da curiosidade de entender como o termo abandono afetivo, que ganhou certo destaque na mÃdia com o assassinato do menino Bernardo Boldrini, em abril deste ano, foi enquadrado pela mÃdia. O objetivo dessa reflexão é apontar condições de possibilidade através das quais se possa compreender a emergência de tal conceito. Além de pensar como sua disseminação midiática colabora para que experiências afetivas privadas circulem cada vez mais no espaço público, de modo a qualificar as demonstrações de afeto, vinculando-as a valores contemporâneos prementes. Para tanto, foram analisadas duas matérias: uma do jornal Zero Hora, que aborda os sinais de abandono afetivo no caso Bernardo Boldrini, e outra do Fantástico, que trata a condenação de um pai, pelo STF, por negligência afetiva. A análise permitiu observar fortes elementos de valorização dos investimentos afetivos na vida dos filhos, especialmente por parte do pai, identificado não só como a figura de autoridade e provisão, mas como um elemento fundamental nos processos de socialização da criança, no interior da chamada cultura terapêutica. A interpretação de que receber atenção, carinho e cuidados diários implica um direito e uma necessidade do filho, dessa forma, chancela uma compreensão que tem sua gênese nesse contexto especÃfico, em que os indivÃduos são resultado de um núcleo psicológico que precisa de investimento. Sendo assim, o abandono afetivo se configura mais do que um termo jurÃdico que circula nos aparatos midiáticos. Ele se constitui, antes, como sinal discursivo de uma dada cultura.