O objetivo do artigo é discutir os dilemas envolvidos no que tem sido caracterizado como o direito penal da vítima. Com essa finalidade, uma análise de conteúdo é feita de trabalhos de cunho etnográfico sobre diferentes instituições do sistema de justiça voltadas para a defesa da mulher, particularmente os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, criados pela Lei 11.340, conhecida como Lei Maria da Penha. Trata-se de fazer uma crítica ao poder excessivo que tem sido atribuído ao atendimento das expectativas da vítima, pois esses trabalhos têm reiterado o fato de a vítima não ser ouvida pelos agentes institucionais e têm insistido na importância de uma atenção detida nas falas da vítima como a condição de medidas mais justas dos processos de gestar e gerir novos sujeitos políticos e o fato de que a fala não pode ser compreendida como um espelho dos desejos e vontades absolutas e cristalizadas das vítimas, chama-se a atenção para o risco de reprivatização de conquistas políticas que, em resposta às demandas dos movimentos feministas, impulsionaram a agenda igualitária. A reprivatização implicaria a responsabilização da vontade das mulheres pelas decisões tomadas pelo Judiciário.
The aim of the article is to discuss the dilemmas involved in what has been characterized as the criminal law of the victim. For this purpose, a content analysis is made of ethnographic studies on different institutions of the justice system focused on the defense of women, particularly the Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher that were created by the Law 11.340/06 known as Maria da Penha Law. The article criticizes the excessive power that has been given in these studies to the victims’ expectations. These studies have reiterated the fact that the victims voices is not heard by the institutional agents and have insisted on the importance of identifying the victims’ expectations as the main condition to achieve fair and equitable measures. Taking into account the complexity of the process of creating and managing new political subjects and the fact that what is uttered can’t be seen as a mirror of the victims’ absolute and crystallized desire, the article highlights the risk of reprivatization of political achievements that have boosted the egalitarian agenda in response to feminist demands. Reprivatization would imply in the responsibilization of women expectations for the decisions taken by judicial system.