“Cultura Surda na Contemporaneidade: (re)significações” foi o título escolhido para este Dossiê, que se inspira na publicação do livro Cultura surda na contemporaneidade: negociações, intercorrências e provocações (2011), o qual con-tou com financiamento do Edital nº 7/2008 CAPES/Ministério da Cultura/Programa Pró-Cultura (MinC) e a colaboração de vários autores nacionais e estrangeiros. De fato, são dez anos de uma publicação que marca uma pesquisa interinstitucional, que debate cultura e educação de surdos. Assim, a ideia é revisitar a temática, trazer discussões recentes e releituras realizadas por au-tores que têm produzido pesquisas na área da cultura e educação de surdos.Desde a publicação desse livro, a temática se expandiu e novos ques-tionamentos e debates surgiram acerca das narrativas sobre cultura surda, sobre a educação escolar bilíngue e as aproximações com as questões identitárias, linguísticas e interculturais. Balizadas em debates contemporâneos sobre a rele-vância da escola e na necessidade de aprofundamento de temáticas sobre edu-cação bilíngue, privilegiamos neste Dossiê artigos que desenvolvessem análises culturais em conexão com os espaços educacionais, evidenciando a potência da língua de sinais, dos processos de aquisição da linguagem, do encontro entre os surdos, das produções culturais surdas. Consideramos que os artefatos culturais estão envolvidos no que se compreende o circuito da cultura, como espaço/tempo de produção de senti-dos e significados culturais na interligação de processos de representação, identi-dade, produção, consumo e regulação dos endereçamentos culturais que envol-vem o campo da educação de surdos. Cabe ressaltar que aquilo que é tomado como produções culturais surdas se encontram alojadas numa ordem discursiva que permite compreender a noção de cultura surda de forma porosa, móvel, híbrida, produzindo assim um interessante caleidoscópio cultural nos diferentes contextos educacionais. O Dossiê está organizado a partir desse circuito cultural, no qual os dez textos que o compõem se articulam entre si em torno de três elementos: cultura surda, literatura surda e língua de sinais. Nesse sentido, os três primeiros artigos indicam uma revisitação/resignificação ao conceito de cultura surda e sua potência, ao se indagar por territórios surdos – espaços de pertencimentos dos sujeitos surdos, nas associações, nas escolas ou nos outros tantos espaços de encontro surdo/surdo. Em Polifonia comunitária na produção das culturas surdas contemporâneas: potência para as singularidades, Anie Pereira Goularte Gomes e Camila Righi Medeiros Camillo nos convidam a compreender a polissemia do conceito de cultura surda, envolvida na produção das verdades no que diz respeito às singularidades e às experiências de surdos em suas infinitas relações e produções. Cláudio Henrique Nunes Mourão e Bruna da Silva Branco, em Os surdos narrando seu território: uma breve incursão, discutem os sentidos de ter-ritório e territorialidade produzidos por surdos em seus textos – dissertativos e poéticos. Nas incursões por diferentes territórios simbólicos, as histórias de experiências narradas potencializam a produção de uma territorialidade de resis-tência surda. Fechando esse primeiro bloco, adentramos aos espaços das escolas de surdos, com o artigo Produções culturais surdas no contexto de educação escolar bilíngue, em que Lodenir Becker Karnopp, Madalena Klein e Márcia Lise Lunardi-Lazza-rin analisam o contexto cultural e linguístico de treze escolas específicas de surdos e procuram entender como se articulam as noções de cultura surda e de educação bilíngue nesses espaços tão festejados pela comunidade surda.O segundo conjunto de artigos toma como centralidade a literatura surda e coloca em movimento importantes significados culturais produzidos pelas comunidades surdas. No texto Já viu uma cobra?” Como os gestuantes de ada-morobe narram uma experiência pessoal, Marta Morgado analisa a estrutura de nar-rativas em língua de sinais da aldeia de Adamorobe, Gana (África). Já no artigo Poesia slam surda: uma literatura de resistência (Themis Farias de França Desiderio e Alex Fabiano Correia Jardim) há uma potência analítica a partir da filosofia da diferença, que resulta na construção de novas possibilidades de pensar, criar, existir e devir-surdo. Na sequência, Carolina Hessel explora a importância do humor na cultura surda e expõe algumas de suas características em O riso na cultura surda – interpretando piadas, reafirmando a importância das piadas dentro da cultura surda, já que o humor contribui para reafirmar identidades e laços dentro da comunidade surda. E para encerrar esse segundo conjunto que toma a literatura como central na análise, Rachel Sutton-Spence apresenta Literatura surda original para crianças pequenas e mostra as possibilidades de criar literatura em Libras para crianças na fase de alfabetização emergente, seguindo as normas literárias da comunidade surda.Finalizando o Dossiê, encontramos três artigos que enfatizam a língua de sinais e sua potência na produção e circulação dos significados negociados na comunidade surda. O artigo Aspectos culturais para a educação de crianças surdas: #casalibras em ação (Vanessa Regina de Oliveira Martins e Regina Célia Torres) descreve e analisa a potência das histórias contadas presencialmente e de forma virtual durante o isolamento social causado pela pandemia da Covid-19, pro-duzidas no âmbito de um projeto de extensão desenvolvido na Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR). Na sequência, Leonardo Peluso Mariana Pereira e Cristiano Vaz nos provocam com a discussão sobre Comunidad sorda en a frontera y su repertorio lingüístico, indagando sobre a fronteira Brasil e Uruguai como um terceiro espaço cultural, linguístico e identitário, que oferece outra possibilidade de análise e endereçamento das questões hegemônicas que envol-vem grupos minoritários. E, concluindo esse terceiro conjunto de artigos, Pedro Henrique Witchs e Eliana Firmino Burgarelli nos brindam com o texto Libras como campo disciplinar: efeitos de uma produção cultural surda, no qual discutem, a partir de um exercício de inspiração genealógica, os aspectos que possibilitaram, nas últimas décadas, o fortalecimento e a expansão do campo disciplinar da Libras no contexto acadêmico. Os textos agrupados nesta obra permitem que façamos uma leitura das situações cotidianas vividas por professores, alunos, pesquisadores, em torno da educação bilíngue para surdos. Impulsionados pelo desejo de produzir referen-ciais que possam auxiliar na produção, circulação e consumo dos significados culturais, propomos pensar as ressignificações que as noções de cultura surda vêm assumindo. Com isso, esperamos contribuir para os debates em torno de questões contemporâneas importantes ao campo da educação de surdos, bem como aos campos que com ele se entrecruzam, como os da cultura, da literatura e da língua de sinais. Assim, apostamos que, uma vez colocados em circulação, esses textos possibilitam e instigam outras teorizações e maneiras de pensar as práticas educativas voltadas às pessoas surdas. Em comemoração aos dez anos de publicação do livro Cultura surda na contemporaneidade: negociações, intercorrências e provocações (2011), oferecemos aos leitores o Dossiê “Cultura Surda na Contemporaneidade: (re)significações”,com dez artigos, convidando para uma produtiva leitura, que provoque ressig-nificações em conexão aos tempos e espaços que ocupamos! As organizadoras